DESCONTEXTUALIZADO
O que está em causa?
Na plataforma X, foi alegada a relação entre as vacinas contra a COVID-19 e o aumento do número de casos de cancro em Portugal. Declarações de Luís Pedro Nunes foram utilizadas para suportar esta mesma relação.
Terá a vacinação contra a COVID-19 influenciado o número de diagnósticos oncológicos?
Um utilizador da rede social X, no dia 2 de abril de 2024, partilhou um vídeo das declarações de Luís Pedro Nunes no que toca ao aumento de casos de cancro nos jovens em Portugal. O mesmo utilizador usou este vídeo para relacionar o aumento de casos com a vacinação contra a COVID-19. O autor da publicação afirma que são os efeitos da vacina a médio-longo prazo e destaca “É um extermínio e nada mais!”.
Mas foi essa a intenção de Luís Pedro Nunes? E será verdade esta relação?
As declarações do comentador da SIC Notícias, estão inseridas num episódio do programa Eixo do Mal. Luís Pedro Nunes fechou o programa afirmando que “o diretor de oncologia do Santa Maria (Professor Luís Costa) veio falar comigo e dizer: ajude-nos que há aqui um problema. (...) há uma epidemia de cancros entre jovens-adultos. É algo que, ele diz que já seria de esperar pós-covid, mas é algo inexplicável a quantidade de jovens adultos que neste momento se deparam com casos oncológicos.”
Por um lado, como replica o comentador, a pandemia teve efeito no número de diagnósticos de cancro. Um relatório do Registo Oncológico Nacional, mostra que em 2020 foram registados, em Portugal, 52.723 novos casos de cancro, menos 7 mil do mínimo previsto, menos 12 mil do máximo previsto. A verdade é que a pandemia atrasou rastreios, diagnósticos e tratamentos. Em declarações à agência Lusa, a coordenadora do RON, Maria José Bento, explicou que “Uma das explicações está na interrupção dos rastreios. Há patologias onde o diagnóstico precoce é muito importante para o sucesso do tratamento e para mais probabilidades de sobrevivência. Isto provavelmente vai-se refletir nos anos seguintes em pior morbilidade e maior mortalidade".
Além disso, estudos recentes ligam o SARS-CoV-2 com o aumento de diagnósticos oncológicos. Em 2020, um estudo português foi publicado na revista Medical Hypotheses dizendo que “o SARS-CoV-2 pode ser capaz de prejudicar diretamente (...) os principais guardiões das funções supressoras de tumor. Além disso, a COVID-19 apresenta uma resposta inflamatória preeminente com stress oxidativo, que atua como iniciador e promotor da carcinogénese”. No final de 2023 foi também publicado um estudo polaco na revista Frontiers in Molecular Biosciences, o qual apresenta evidências claras desta mesma ligação.
Filipe Froes, pneumologista e diretor da Unidade de Cuidados Intensivos do Hospital Pulido Valente, também ex-coordenador do Gabinete de Crise para a Covid-19 da Ordem dos Médicos e um dos peritos da Direção-Geral da Saúde para a gestão da pandemia, falou à CNN sobre estes e outros estudos. O especialista explica que houve uma “aceleração de casos iniciais de doença neoplásicas que se iriam manifestar mais tarde, mas que se manifestaram mais cedo, sendo que a covid-19 foi a grande aceleradora” - algumas dessas neoplasias eram iniciais, outras vieram a ser reincidências, como relata esta investigação - e que a comunidade médica e científica começa agora a perceber que “a própria infeção por SARS-CoV-2 pode ser um fator de indução de novos casos de doença oncológica”.
Por outro lado, apesar destas relações entre o vírus e o cancro, não há nenhuma evidência de que os diagnósticos oncológicos tenham aumentado devido à vacinação. A Organização Mundial da Saúde (OMS) garante que “as vacinas COVID-19 passam por um rigoroso processo de teste em várias etapas, incluindo grandes ensaios clínicos que envolvem dezenas de milhares de pessoas. Esses ensaios são especificamente projetados para identificar quaisquer preocupações de segurança.”
A Imune.pt, uma iniciativa sobre vacinação e imunização do Instituto de Higiene e Medicina Tropical da Universidade Nova de Lisboa (IHMT-NOVA) cuja informação é “revista e verificada, de forma independente, pela equipa científica do IHMT-NOVA”, diz que as vacinas “conseguem desencadear uma reação no sistema imunitário para criar anticorpos, mas sem o risco de provocar doença”.
Posto isto, não existem provas de que as vacinas de mRNA potenciem o desenvolvimento de cancro. Pelo contrário, atualmente estão a ser desenvolvidas vacinas deste tipo para combater vários tipos de cancro, entre os quais o de pele, do pâncreas ou do cérebro.
Conclui-se que a afirmação em questão é MENTIRA, ainda assim, foi utilizado um vídeo, ao qual retiraram o contexto para dar credibilidade a algo sem nenhuma base factual.
Conclui-se, então, que a publicação é DESCONTEXTUALIZADA.